Novos hábitos vieram para ficar

Novos hábitos vieram para ficar

Ressabiados com a retomada econômica, consumidores passaram a adotar novas práticas para equilibrar orçamento doméstico. Especialistas afirmam que comportamento deve permanecer

s instabilidades política e econômica ainda não têm data para acabar, mas um de seus legados já se faz presente: os novos hábitos de consumo. Em julho de 2017 dois milhões de famílias em São Paulo consideravam-se endividadas, segundo a Federação do Comércio de São Paulo (Fecomercio), 66 mil a mais que no mesmo período do ano passado.

Esse é um movimento que já perdura há, pelo menos, dois anos. Diante disso, o impacto no varejo tornou-se inevitável. O downgrade de marcas e a diminuição na frequência de visitas aos centros de compras mostraram que o consumidor estava mais preocupado em se reorganizar financeiramente, antes de assumir novas dívidas.

De acordo com a pesquisa Total Retail 2017, feita pela PwC, as compras diárias, tanto na loja física quanto no on-line, caíram para menos da metade em comparação com o ano anterior, dando espaço para compras com prazos mais longos.

“O consumidor hoje é muito mais ativo no ponto de venda. Ele tem tolerância zero se alguém tentar levar vantagem, de certo modo está até um pouco irritado. O nervosismo do dia a dia reflete na relação de compra”, analisa a diretora do Ibope Inteligência, Marcia Sola.

A especialista observa que o consumidor tem feito escolhas mais racionais e uma característica desse período foi a migração do hipermercado para o atacarejo, onde a sensação de economia é maior. “Ele diminuiu a frequência de visitas ao shopping center, não porque rejeite o formato, mas o comportamento está ligeiramente mais racional. Está apenas não querendo ser tentado”, explica Marcia.

O estudo é global, mas a PwC dedicou algumas questões exclusivas para o Brasil, que identificaram três tendências de consumo: a busca por melhores ofertas, redução de gastos mensais e revisão no volume de itens adquiridos no período.

Tecnologia

O fundador da consultoria Cliente Amigo, Claiton Pacheco, explica que a ciência sobre o novo comportamento do consumidor, motivado por maior acesso as informações é geral, mas a prática ainda é ínfima. “Nós estamos no início da jornada. O comportamento do consumidor mudou em uma velocidade muito grande, mas o comportamento do varejista, não”, avalia.

De acordo com Pacheco, pequenas práticas diárias poderiam aperfeiçoar a abordagem na loja física e reverter a venda para o ponto. “As pessoas vão à loja para conhecer o produto e comprar na internet, todo mundo sabe disso, mas o vendedor nunca pergunta se o consumidor já viu o item on-line e por qual valor. Tem como argumentar com o cliente na loja, isso ainda não provocou uma mudança de comportamento do varejista”, explica.

O especialista comenta que inteligência artificial tem sido aliada para aproximar a loja física do consumidor, identificar tendências e comportamento, no entanto, o varejista ainda não conhece o seu consumidor. “Daqui a alguns anos, falaremos sobre marcas que morreram por não se adequar. Vão virar história”, afirma.

Veio para ficar

A crise pode até ser passageira, mas os hábitos do consumidor tendem a permanecer. Pelo menos, boa parte deles. Do total de participantes da pesquisa da PwC, 41% pretendem “manter comportamentos atuais de consumo adquiridos e poupar dinheiro” e 38% dizem que vão “aumentar a quantidade de pagamentos à vista”. “Dificilmente as pessoas vão voltar a pagar mais pelos itens. Alguns hábitos adquiridos vão ficar, o consumidor sai diferente dessa crise e as empresas também”, analisa a sócia-diretora da consultoria Blue Numbers, Camila Pacheco.

Além dos novos hábitos de consumo, as empresas modificaram seus próprios costumes internos para manter as portas abertas nos últimos anos. “As franqueadoras precisaram encarar a realidade de que as franquias não estavam vendendo”, explica a sócia-diretora da consultoria Blue Numbers, Camila Pacheco.

Com o mercado estabilizado, a estrutura de suporte da franqueadora gira sozinha, sem tanta necessidade de acompanhamento de outras áreas, que estão geralmente voltadas para inovação e expansão. Nos últimos anos, no entanto, tudo mudou. “O risco de novas operações ficou muito alto, não se saberia como o mercado reagiria, precisou se voltar para o dia a dia, principalmente para a otimização de custos”, explica Camila.

Na visão da especialista, a receita que fez as lojas continuarem sobrevivendo durante a recessão foi controle financeiro, retenção e capacitação de pessoas. “Quem estava desorganizado foi engolido, porque não tinha como se sustentar, já estava trabalhando no limite. Quando vem a onda, se não estiver com os pés muito firmes no chão, vai junto”. Camila explica que a estiagem financeira costuma deixar os erros de planejamento estratégico, ainda do início do negócio, à mostra.

O franqueado também leva lições desse período. Não se pode mais subestimar a importância dos números e métricas na gestão dos negócios. “O brasileiro gosta de atender o público, o que é bom, mas não pode esquecer de olhar para dentro do negócio, para os detalhes”, orienta.

Um breque na expansão

O Grupo Afeet paralisou a expansão em 2013 para trabalhar a segmentação de suas marcas. A estrutura da franqueadora passou de 20 para 70 pessoas, com olhares direcionados para cada rede e não mais como um time único.

A primeira a ser vista com lupa foi a Artwalk, com ambientação de loja que gerasse uma experiência diferenciada de compra e ressignificação do papel dos vendedores, que hoje são consultores de venda. A marca cresceu 49% no primeiro ano do projeto.

“85% dos nossos clientes pesquisam na internet antes de comprar na loja física. Eles estão mais informados, mas buscam no ponto de venda uma troca com os vendedores. A equipe precisa estar preparada para responder o que o cliente quer saber”, explica o gerente de expansão do grupo, Rodrigo Faria.

Depois, foi a vez da Authentic Feet passar por uma remodelação que a transformou em uma marca especializada em moda esportiva. O resultado foi o incremento de 20% no faturamento. A última a receber a segmentação foi a Magic Feet, mas ainda não houve mensuração.

Faria conta que o grupo todo cresceu 5%, enquanto o mercado de calçados caiu 15%. “Foi um passo acertado brecar a expansão para se acertar, revitalizar os projetos e agora voltar com agregação de valor, com estrutura para comportar esse crescimento. Prevemos nos próximos cinco anos dobrar o número de lojas do grupo”, afirma.

Em busca da maturidade

Nos últimos anos, a Água Doce optou por encerrar cinco lojas. Em três delas a opção foi de não renovar com o franqueado, mas duas não conseguiram ser resgatadas. O diretor da marca, Julio Bertolucci, conta que a rede precisou se reestruturar internamente e mostrar para o franqueado como lidar com o cenário difícil que viria a enfrentar. “Através de preparação e treinamento, fizemos com que ele voltasse os olhos para isso. Foi um período importante para o amadurecimento do franqueado. Ele conseguiu entender que tem perda de faturamento, porque tem queda de consumo”, explica.

Com isso, o executivo conta que conseguiu melhorar o atendimento das unidades, praticar inovações no cardápio a custo zero e fomentar ações de endomarketing. “Em qualquer momento difícil que a rede venha a passar, em função do mercado, é importante o franqueado ter a segurança que a franqueadora está se movimentando e procurando meios para solucionar”.

As ações implementadas já surtiram efeito. Bertolucci enxerga uma rede mais madura e profissional, com olhar comercial, mas também nos indicadores do negócio. “Vínhamos crescendo 15% ao ano e caímos para 2%, não perdemos e nem deixamos de crescer”. Das cinco lojas fechadas, duas já foram repostas. “Tudo isso fez com que conseguíssemos resultados bons. Principalmente inovação consciente em cima daquilo que a gente já tinha. O franchising já possui sinergia, nós só aprimoramos isso”, afirma.

Orçamento Base Zero

A primeira franquia da Lojas Viggo deve ser inaugurada até o fim do ano, mas a rede já fez diversos ajustes, nas seis lojas próprias, para comportar o modelo. O orçamento base zero adotado pela empresa diminuiu as contas de telefone das lojas, renegociou valores com shopping centers e tomou diversas outras medidas para reduzir as despesas fixas das operações. O resultado foi um ganho de R$ 40 mil. “Focamos em enxugar determinados custos que, quando está na bonança, muitas vezes passam despercebidos”, explica o diretor de marketing e expansão da rede, Diogo Oliveira.

 

Se você está pensando em comprar uma franquia, confira artigos que o Portal do Franchising separou para te ajudar: