Como (des)motivar a equipe

Como (des)motivar a equipe

Especialista afirma que premiações e reconhecimentos individuais podem causar efeito contrário dentro das empresas

Premiar ou reconhecer funcionários dentro das empresas é uma das práticas menos eficazes para motivação. De acordo com o consultor e professor de pós-graduação na PUC-PR, FAE Business School e ISAE/FGV Luiz Gaziri, os funcionários precisam ser motivados enquanto equipe. “O ser humano depende dos outros para viver e os relacionamentos são grande parte da motivação no dia a dia. Quando a empresa separa e faz ranking como estratégia para motivar, está desmotivando”, explica.

De acordo com ele, é preciso entender que os funcionários são pessoas, com diferentes experiências de vida e propensos a terem problemas que, invariavelmente, serão levados para o ambiente de trabalho.

Gaziri é autor do livro A Incrível Ciência das Vendas. “Demorei dez anos para ler todos os artigos científicos que deram origem a ele. Não é baseado em intuição ou no que uma empresa fez para ter melhores resultados”, explica.

Empresas precisam repensar o modelo de gratificação para tornar o convívio das equipes mais harmoniosos e isso também se reflete na forma como o cliente vê o negócio. Confira mais detalhes na entrevista a seguir:

Por que separar funcionários entre melhores e piores pode atrapalhar o desempenho da empresa?
Quando reconhece uma ou poucas pessoas e não leva em consideração o trabalho dos demais, a empresa manda uma mensagem de que o indivíduo é mais importante do que o grupo. Com isso, incentiva o comportamento individual e não o de colaboração, que é o sucesso de toda empresa. Não podemos mandar sinais de que a empresa recompensa o indivíduo. Elas começam a ajudar menos as outras, passar a perna e ter comportamento antiético para alcançar esses benefícios. Danifica os laços sociais da empresa e piora os relacionamentos entre as pessoas.

Então é preciso estimular o relacionamento entre as pessoas?
Um dos pilares da motivação é o bom relacionamento. Sem isso, diminui a performance e aumenta indicadores como o turnover. Outro fator que pode complicar é que, geralmente, os funcionários colocam em xeque qual foi a metodologia para avaliar e descredenciam a empresa. O ser humano tem a tendência de achar que sempre faz mais do que realmente faz, isso chama viés da responsabilidade, é uma questão psicológica. Isso vai acabar sendo avaliado de forma negativa pelas pessoas e não trará benefícios.

O reconhecimento individual pode prejudicar o que foi beneficiado também?
Temos que lembrar que as pessoas se comportam em grupos. Se eu quero reconhecer um indivíduo como funcionário do mês, os outros acabam isolando-o, pois ele é visto como um que não faz parte do grupo. É um resultado diferente do que a empresa quer. Ninguém vai se espelhar nele, porque é uma característica do ser humano.

Como a empresa pode contribuir para criar um ambiente melhor para os funcionários?
As empresas têm que saber que o ambiente é fundamental para a motivação dos funcionários. Nossos relacionamentos são cruciais para o alcance dos resultados. Hoje, as estratégias são colocar um funcionário contra o outro e valorizar o individualismo ao invés da colaboração. Apesar de todos saberem que colaboração é estratégia para o sucesso, fazem o contrário. Temos que focar no coletivismo, na colaboração. Toda estratégia que tem metas, que premia as equipes são melhores do que as que premiam as pessoas individualmente. Para isso, tem que entender de motivação e isso é difícil. Pouquíssimas pessoas sabem o que motiva verdadeiramente e simplesmente seguem o que todas as outras empresas fazem.

O que as empresas fazem de errado ao reconhecer um funcionário?
Vemos uma participação muito grande das empresas dando colaborações, dinheiro e isso nem sempre incentiva. Aliás, existem mais de cem anos de pesquisa científica que mostram que dinheiro, na verdade, prejudica o ambiente. Hoje, a teoria mais aceita é a da autodeterminação. As empresas que têm melhor performance têm relacionamentos e aceleram o alcance de metas. Quando se explica algo para um amigo, ele entende mais rápido do que com alguém que não tem uma relação tão boa. É preciso incentivar os bons relacionamentos para ter bons resultados. Amizade aumenta a eficiência da empresa. Crie estratégias que unam as pessoas.

Quais são os desafios disso nas corporações hoje em dia?
Um dos principais é que as empresas preferem fazer o que todas as outras fazem ao invés de questionar as estratégias mais básicas. Uma companhia que está começando nem pensa como remunerar os vendedores, faz o que todo mundo já faz. Não questiona se comissão é a melhor forma. Se fosse a melhor estratégia, por que vemos empresa com dificuldade financeira? Por que vemos várias empresas quebrando?

Por que as empresas seguem esse caminho?
Temos um padrão de comportamento chamado viés de confirmação, que é quando o cérebro tem prazer de ouvir algo que a gente já acredita. Se eu ouvi a vida inteira que isso é o certo, mesmo que venha alguém com base para falar, o nosso cérebro vai fazer um esforço para negar. Uma das principais funções do nosso cérebro é economizar energia. Nossos antepassados precisavam dessa energia para fugir de um predador, por exemplo. Nós não temos mais esse tipo de ameaça, mas nosso cérebro funciona da mesma forma. Ele procura mecanismos para relevar a informação e mantém nosso mundo igualzinho. E isso é um perigo.

Quais são as melhores práticas para motivar mais vendas?
Temos que rever a questão da remuneração. Pagar comissionamento não incentiva mais vendas e nem melhora a percepção do cliente. Precisa virar todo o pensamento. Tem estudos que mostram que a pessoa precisa ter segurança financeira para ter boa performance no trabalho. Essa falta de segurança atrapalha. Muitos chefes gostam do discurso de que os problemas ficam para fora da empresa. Isso só seria possível se os funcionários fossem robôs. Qualquer influência externa pode atrapalhar, inclusive financeira. As empresas têm que parar de acreditar em intuição e ir mais para o lado da ciência, psicologia e colher os frutos. Hoje em dia, muitas empresas como a Nike e a Apple optam por pagar um salário fixo alto. Todo vendedor recebe um fixo.

Isso pode ajudar na percepção do cliente também?
O vendedor que ganha um salário corre menos risco de ter comportamento antiético, como enganar o cliente ou a própria empresa. Tem gente que, depois de bater a meta, segura venda para o mês seguinte e prejudica a empresa. Tem experimentos científicos que mostram que quando as pessoas têm a possibilidade de trapacear, mais de 80% das pessoas o fazem. Então a remuneração fixa e a meta em grupo são dois segredos para ter melhor performance em vendas. Quando um vendedor fala para o cliente que não ganha comissão, o cliente passa a confiar mais no vendedor, pois ele sempre pode achar que, lá no final, o vendedor poderia passar a perna nele.

Qual a melhor forma de avaliar os funcionários?
Medir o quanto cada pessoa ajuda os colegas a terem sucesso. Muitos estudos mostram que aquelas pessoas que ajudam o outro são as que trazem os melhores resultados, as mais bem avaliadas pelos colegas e pelos clientes. Faça uma avaliação, por exemplo, quanto que cada um ajuda no alcance das metas, o quanto que cada um ajuda no trabalho no dia a dia. Quando criamos um ambiente de metas em grupo, de colaboração, de sinalizar competência em grupo, também ajudamos a ter melhor performance e conseguimos resultados legais. Analisar quanto que cada funcionário ajuda no dia a dia é uma forma de trazer uma métrica única.

§ Autonomia: sentir que tenho controle sobre meu destino, meus horários, minhas roupas, sair mais cedo para ir ao médico, escolher benefícios, pedir opinião para as pessoas. Os funcionários entendem que têm controle e isso é bem benéfico.

§ Competência: valorizar que a pessoa está cada vez melhor, desenvolver habilidades profissionais e pessoais. O trabalho é, na verdade, uma ferramenta para ser cada dia melhor em uma atividade que fazemos. Dinheiro é forma perigosa de sinalizar competência. Pode-se fazer uma celebração para a equipe que bate a meta, por exemplo. No feedback, mostre como a pessoa estava meses atrás, como melhorou e dê a certeza de que, se continuar se esforçando, será ainda melhor. Sempre lembrando que a equipe é mais importante que o indivíduo.

§ Ter bons relacionamentos: ter amigos dentro do ambiente de trabalho, autonomia para falar o que quiser, na hora que quiser, sem ser ridicularizado. Um chefe que não aceita opinião, que acha que a dele é mais importante que a dos outros, é prejudicial.