Sem medo de recomeçar

Sem medo de recomeçar

Empresários que já fracassaram encontram seu caminho no franchising e aprendem com erros do passado ao gerir novos negócios

Matéria reproduzida da Revista Franquia & Negócios – Edição 77

por Paulo Gratão

Dinheiro, o produto comercializado por André Oliveira, 38 anos, parecia que teria horizonte azul para sempre. Em 2004 ele iniciou uma empresa de empréstimos e em três anos já tinha 20 lojas. Tudo ia bem até que a crise dos Estados Unidos, em 2008, veio como um vendaval e levou 18 unidades, deixando apenas duas. “No fim de 2009 eu pensei se procurava um emprego ou fechava esse negócio. A palavra ‘franquia’ surgiu na minha cabeça, mas não sabia como funcionava”, comenta.

Oliveira foi buscar informações com o Sebrae. Apresentou o modelo de negócios e eles o ajudaram o formatar a CredFácil. Quando o mercado voltou a responder positivamente, ele já tinha a empresa preparada para expandir. “Comecei em 2009 vendendo para amigos, por valor abaixo do mercado. Um foi indicando para outro e foi crescendo regionalmente”. Hoje são 80 lojas abertas.

A crise que assolou o Brasil nos últimos anos ajudou Oliveira a crescer, pois seu produto ficou em alta novamente. “Em 2017 cresci 32%. A venda de franquia triplicou, as pessoas estão enxergando que o negócio prospera, ganhamos um novo público”.

Ele olha para trás e diz que aprendeu com os erros. Não esperava o que aconteceu e não havia pensado em alternativas. Agora, ele tem um leque de produtos além dos principais para que o negócio se sustente, independentemente das movimentações do mercado.

É fundamental errar

Todo franqueador de sucesso já teve, pelo menos, um fracasso, na visão do sócio da consultoria Loja de Franquia, Lucien Newton. “Alguns têm vergonha de falar, não gostam de relembrar esse passado de não tanto sucesso, outros falam e até usam em palestras, lidam muito bem”, explica.

O erro é saudável e necessário. Muitas vezes, é o fator que impulsiona novas decisões do empreendedor, que culminam em grandes acertos. “Franqueadores que já quebraram aprenderam como não fazer, esses são melhores ainda. Em rede de franquia o papel do franqueador é reduzir o erro do franqueado, fornecer experiência para que ele erre o mínimo possível”, observa o consultor. Isso faz com que o franqueado consiga se entregar à operação sem tanto medo de errar, pois é um negócio testado.

Da noite para o dia

Certa manhã, Claudinei dos Anjos, 49 anos, acordou e descobriu que havia perdido toda sua fábrica em um incêndio. O evento o pegou completamente desprevenido e fez com que seus planos fossem por água abaixo. Precisou alugar barracões para acomodar a nova estrutura e fazer outros projetos. “Tínhamos muitos pedidos dos clientes e mostramos a todos os fornecedores que aquilo que devíamos a eles tinha pegado fogo, pedimos parcelamento e que eles nos fornecessem no prazo normal”, explica.

Anjos conseguiu reparcelar o pagamento de toda a matéria-prima, recuperou o capital em 20 meses e reconstruiu a fábrica. Depois disso, sua visão de negócios mudou completamente. “O incêndio nos ensinou que não podíamos mais errar em nada. Todo gasto precisaria ser muito bem pensado e planejado. Toda venda precisava ser muito bem calculada. Quando a empresa vai bem, não tem os controles, não administra, deixa de cuidar. De repente, acorda com uma dívida enorme e não tem o que fazer”, comenta.

Fim de uma era

O casal Mauricio Valente, 54 e Valéria Ramos, 44, chegou a ter 30 lojas de CDs e DVDs, no Rio de Janeiro. Com o tempo, eles tentaram diversificar com livrarias, mas não deslanchou. As mudanças no mercado fizeram com que a outrora próspera rede se diluísse.

Dentro das lojas havia dois cafés, que foram a introdução do casal ao mundo da alimentação. Quando o negócio fechou as portas, eles resolveram se tornar franqueados de diversas marcas do ramo. “Erramos porque abrimos quatro marcas de uma vez e cada uma tinha um jeito de trabalho, ficou muito diversificado. Umas foram boas, outras nem tanto, mas serviram de experiência para o nosso negócio. Em 2012 criamos a nossa marca própria”, explica Valente.

A Dagosto Bristrô une tudo que eles aprenderam com as marcas que comandaram, iniciou a expansão em 2017 e já contabiliza três franquias no Rio de Janeiro. A primeira unidade paulista deve inaugurar depois do carnaval.

Eu, empreendedor?
A alta no desemprego também foi um novo gatilho que despertou anseios empreendedores que estavam adormecidos. Newton avalia que muitos empresários já tinham a vontade de ter o negócio próprio, mas o emprego fixo os distanciava disso. Agora é hora de fazer uma análise intrapessoal para verificar se tem o perfil. “Há pessoas que estão em empresas e ficam discordando demais, como um pássaro preso na gaiola, sentindo vontade de voar. É nesse momento que tem que refletir”, aconselha.

O sonho de empreender sempre esteve em Sandra Marostica, 47 anos, mas enquanto havia emprego, ele permanecia em segundo plano. Quando ela foi desligada de uma grande montadora de veículos, participou do Plano de Demissão Voluntária (PDV), estudou o mercado e entendeu que era hora.

Sandra fez cursos na ABF e conheceu a Límpidus em uma das feiras da entidade. “Eu queria algo que fosse primordial no mercado, que nunca vai deixar de ter demanda. Limpeza foi um dos primeiros segmentos em que pensei. Por mais crise que tenha, o mercado nunca se fecha totalmente”. Ela iniciou a empresa no começo do ano passado, e muitos de seus colegas que foram demitidos abriram empresas na região e hoje são seus clientes.

Os irmãos Nivaldo, 50 anos, e Guto Covizzi, 47 anos, nasceram em uma família empreendedora, com uma extensa história de aprendizados. O pai dos dois tinha uma fábrica de doces, que faliu em 1981, e a família abriu outra similar, em 1988, que foi dragada pelo Plano Collor.

Nivaldo passou a ser funcionário de grandes empresas até que conseguisse capital suficiente para empreender novamente. Isso ocorreu em 1998, quando vendeu sua casa para montar uma pequena pizzaria chamada Bella Capri, em Mirassol (SP). Em paralelo, Guto continuava trabalhando em outras empresas, até que a distância da família e a oportunidade de ter o próprio negócio o levaram a entrar na sociedade com o irmão.
Em 2007, a Bella Capri tornou-se franquia e hoje conta com 18 unidades. A projeção de faturamento em 2017 é de R$ 30 milhões e para 2018, R$ 45 milhões.

Newton alerta que o franchising reduz os riscos, mas não elimina as possibilidades de erros. “Não existe garantia de sucesso, você sabe como o mês começa, mas não sabe como termina. As pessoas precisam estar preparadas também para quebrar a cara”, afirma.