Lições da pandemia

Lições da pandemia

Maior especialista do mundo em franchising, Greg Nathan diz que a crise provocada pela covid-19 tornou ainda mais evidente a importância da parceria entre franqueadores e franqueados, da liderança e da comunicação

No dia 11 de março, o mundo completou dois anos em pandemia.

Neste período, muita coisa mudou no franchising: as redes tiveram de rever suas estratégias de vendas e expansão, ampliar o leque de canais para seguirem operando e se adaptarem ao crescimento do on-line e ao novo comportamento do consumidor.

Todo esse movimento, de acordo com o maior especialista do mundo em franquias, o psicólogo empresarial e fundador da consultoria Franchise Relationships Institute (FRI), Greg Nathan, tornou ainda mais evidente a importância da boa liderança e da comunicação clara e assertiva.

Para o autor dos best-sellers Fator-E e Parcerias Lucrativas e condutor do programa Franchisor Excellence MasterClass – evento realizado no Brasil pelo Grupo BITTENCOURT –, a crise provocada pela covid-19 ainda deu ao setor algumas oportunidades, como a “de destacar um de seus benefícios mais importantes, que é ter uma rede de pessoas solidárias com visão e valores compartilhados, trabalhando juntos para alcançar o sucesso”.

Em entrevista exclusiva à revista Franquias & Negócios, o especialista explora um pouco mais estes temas e ainda fala sobre as estratégias práticas para lidar com uma rede de franquias, o que é preciso para atingir a excelência neste mercado tão competitivo e as tendências para os próximos meses. Confira os principais trechos a seguir.

O que a pandemia significou para o franchising?
A pandemia deu ao franchising uma oportunidade de destacar um de seus benefícios mais importantes, que é ter uma rede de pessoas solidárias com visão e valores compartilhados, trabalhando juntos para alcançar o sucesso.

Os operadores de negócios independentes foram deixados à própria sorte, enquanto os franqueados tiveram o apoio de seu franqueador, bem como uns dos outros. Isso inclui apoio emocional e empresarial, e ambos são extremamente importantes.

Passados dois anos desde que a maior crise sanitária da história recente foi decretada, qual o maior desafio para o sistema de franquias?
Diversas indústrias enfrentam desafios diferentes e, claro, também têm oportunidades diferentes.

Um desafio que todas as empresas estão enfrentando no momento é a escassez de mão de obra e interrupções na cadeia de suprimentos.

Ambas são ameaças significativas à viabilidade de negócios atual e futura.

Muitos franqueados tiveram que fechar suas operações parcial ou totalmente devido à indisponibilidade de funcionários ou incapacidade de trabalhar.

A escassez de pessoal também elevou o preço da mão de obra, comprimindo as margens de lucro.

Da mesma forma, a interrupção da cadeia de suprimentos aumentou o preço das matérias-primas em muitos setores, também comprimindo as margens.

A escassez também criou problemas na entrega de uma boa experiência ao cliente, o que tem um efeito de ameaçar a reputação de uma marca.

E esses desafios devem permanecer por muito tempo?
Todos esses são desafios significativos e importantes, e provavelmente continuarão no futuro.

A forma de consumir mudou, migrando para o on-line, e isso também teve bastante impacto nas redes. Como essa questão deve ser trabalhada pelo franqueador e o franqueado a partir de agora?
Os franqueadores devem investir em insights do cliente para entender suas mudanças de comportamento.

Essa pesquisa mais formal deve ser combinada com a pesquisa informal da linha de frente pelos franqueados, que também têm uma compreensão única das necessidades e dos novos comportamentos dos clientes.

Os franqueadores precisam discutir essas descobertas com os franqueados, por exemplo, em conselhos consultivos de franquia.

Eles também devem realizar testes em possíveis mudanças para verificar se elas funcionarão antes de implementá-las.

Os franqueadores definitivamente não devem operar em um silo sem a participação dos franqueados.

Com tantas mudanças nos negócios e nas pessoas, o que o interessado em adquirir uma franquia deve levar em conta na atualidade?
Existem grandes oportunidades para abrir novos conceitos de franquia, bem como trazer novos franqueados para as redes existentes.

Ao iniciar um novo conceito é vital que um franqueador em potencial busque um suporte de consultoria de boa qualidade, como o Grupo BITTENCOURT, pois existem muitas armadilhas e, se o conceito não for bem-sucedido, afetará muitas pessoas.

Quando os franqueadores estão trazendo novos franqueados para a rede, é vital que eles tenham um processo claro para avaliar sua adequação e garantir que as expectativas sejam realistas.

O relacionamento de franquia geralmente dura mais de sete anos, então os franqueadores precisam pensar em uma franquia como uma relação interdependente de longo prazo, e não como algo a ser vendido como um pedaço de imóvel.

O que leva uma rede de franquias à excelência?
Geralmente, existem cinco peças que impulsionam a excelência em uma rede de franquias, e as abordamos com muitos detalhes em nossa Masterclass de excelência em franqueadores, realizada no Brasil pelo Grupo BITTENCOURT.

Em primeiro lugar, os franqueadores precisam ter bons sistemas e o processo é recrutar franqueados de qualidade, porque a qualidade das pessoas em uma rede de franquias acabará por impactar em seu desempenho e na entrega da experiência do cliente.

Em segundo lugar, os franqueadores devem fornecer uma série de processos de orientação para apoiar, desenvolver e motivar os franqueados.

Esses processos de orientação incluem suporte de campo, treinamento contínuo, sistemas de benchmarking e análise de dados e reuniões interativas onde informações úteis podem ser compartilhadas entre os participantes.

Em terceiro lugar, a excelência no franchising envolve ouvir o feedback do franqueado. A maior reclamação que ouvimos dos franqueados é que eles não se sentem respeitados e ouvidos o suficiente e querem ser consultados sobre questões que os impactam.

Em quarto lugar, é preciso o envolvimento de todos com a marca, que é a reputação de um grupo. Isso significa educar e inspirar constantemente os franqueados e sua equipe, ou seja, todos que operam sob a marca, sobre como oferecer uma excelente experiência ao cliente da maneira certa sempre.

Por fim, a excelência do franqueador envolve a entrega de liderança confiável, onde os franqueadores estão tomando decisões inteligentes e baseadas em evidências, mostrando um cuidado genuíno com o sucesso de seus franqueados e mantendo os mais altos níveis de integridade na forma como se comportam.

Uma liderança credível é particularmente vital para conseguir a adesão do franqueado à mudança.

Além dos pontos que citou, o que mais determina uma boa liderança, sobretudo em um cenário como o que ainda estamos vivendo?
Uma boa liderança envolve demonstrar competência, cuidado e integridade.

Devido ao nível de incerteza sob o qual todos estamos operando, os franqueadores precisam manter uma abordagem calma e clara, tomar as melhores decisões possíveis com as informações que possuem, mas também terem a mente aberta e estarem prontos para mudar sua posição à luz de novas informações ou mudanças de circunstâncias.

Como é um momento que pode gerar estresse e atenção demasiada ao que pode dar errado, os franqueadores precisam se comunicar mais do que nunca.

Uma maneira inteligente para fazer isso de forma eficaz é usar uma filosofia de cinco por cinco, na qual você comunica informações importantes de cinco maneiras diferentes e por cinco vezes.

E lembre-se sempre de que a comunicação deve ser bidirecional e que os franqueados precisam ter a oportunidade de fazer perguntas e esclarecer quaisquer dúvidas.

Você sempre fala sobre a aplicação da psicologia para o sucesso de uma rede de franquias. Por que isso é tão importante?
Gostamos de falar sobre três pernas de franchising, como as pernas em um banquinho, e todas as três precisam ser fortes para ter estabilidade e força.

Há uma vertente legal que é projetada para garantir que franqueados e franqueadores estejam livres de suas obrigações mútuas, e isso geralmente é explicado na documentação da franquia.

Existe uma vertente comercial que abrange o modelo de negócio e a gestão da marca – muitas vezes é por isso que franqueados e franqueadores optam por entrar em negócios juntos, porque sabem que há eficiências no uso de capital, pessoas e processos que podem impulsionar o sucesso, desde que os sistemas de negócios sejam robustos e gerem lucratividade para todas as partes.

E a terceira perna é psicológica, que envolve ambas as partes tendo confiança e compromisso uma com a outra. Por ser invisível, muitas vezes é esquecido, mas nossa experiência é que é o componente mais importante para o sucesso.

Confiança significa que as pessoas se sentem seguras e confiam nas intenções umas das outras. Compromisso significa que as pessoas tomarão medidas positivas para fazer o que disseram que fariam.

Passamos 30 anos estudando a psicologia do franchising e ainda estamos aprendendo muito. É um campo fascinante.

Além da psicologia, promover uma cultura de franquia saudável também impulsiona o desempenho?
Cultura é como as pessoas habitualmente se comportam quando se reúnem, poderia ser definido como “como fazemos as coisas por aqui”.

Acreditamos que uma cultura saudável tem cinco componentes. Em primeiro lugar, todos estão se concentrando na melhoria contínua.

Em segundo lugar, as pessoas estão colaborando e compartilhando informações.

Em terceiro lugar, as pessoas estão abertas ao feedback e mudam de ideia diante de novas informações.

Em quarto lugar, as pessoas são apaixonadas por seus produtos e serviços e comprometidas em personificar sua marca na forma como se comportam. Finalmente, as pessoas são respeitosas e apreciativas umas das outras.

Se essas condições puderem ser cultivadas e mantidas, elas fornecerão uma plataforma imparável para o crescimento dos negócios e uma vantagem competitiva.

Para finalizar, quais tendências você prevê para o franchising?
Algumas das tendências que prevejo incluem o fortalecimento da operação multifranquias.

Outro é um aumento nas fusões e aquisições, onde as empresas de capital de risco estão investindo em redes de franquias e as redes maiores estão comprando seus concorrentes menores.

A geração Y está agora assumindo as rédeas dos cargos de liderança, tanto como executivos de franqueadores quanto como franqueados, e trazendo uma abordagem nova, mais experiente em tecnologia e de mente aberta para suas unidades de negócios.

Haverá um foco maior na coleta e análise de métricas, com os franqueadores tendo acesso ao desempenho do negócio em tempo real e podendo fornecer rapidamente dados de benchmarking úteis aos franqueados.

Há também uma expectativa crescente em todo o mundo de que os colaboradores serão tratados de forma justa. Haverá mais atenção à saúde e bem-estar, e qualquer um que empregue pessoal precisará oferecer condições de trabalho flexíveis.

Quando apropriado para o negócio, isso envolverá as pessoas que podem trabalhar em casa algumas vezes.

Além disso, com a maioria dos franqueados com mais de sete anos de mandato, os franqueadores precisarão melhorar a forma como estão se envolvendo com eles e mantê-los atualizados e em desenvolvimento, nos níveis pessoal e comercial.