Entrevista

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Matéria reproduzida da revista Franquia & Negócios – Edição 51

O especialista norte-americano em ciência do consumo, Paco Underhill, fala sobre o novo consumidor e a influência do comportamento no varejo

O marketing vem das ruasSe tem algo que se espera que toda mulher goste, e saiba fazer bem, é comprar. Pelo menos é o que apontam os estudos do especialista em ciência do consumo norte-americano, Paco Underhill. Segundo o livro “O que as mulheres querem” (What Women Want?), lançado no Brasil pela Campus-Elsevier, as mulheres têm uma predisposição maior que o homem para compras desde a Pré-História, quando eram as responsáveis pela colheita e armazenagem dos bens na caverna, enquanto os homens saiam para caçar.

Porém, se por um lado há um talento nato, por outro, no mundo moderno, a entrada massiva da mulher no mercado de trabalho limitou, e muito, o seu tempo para o consumo. Segundo Underhill, a consequência dessa rápida mudança nos hábitos de consumo das mulheres acarreta um aumento substancial nos desafios que deverão ser encarados pelo marketing. “O mundo das compras vai mudar muito mais nos próximos cinco anos do que mudou nos últimos cinquenta”, afirma.

A reportagem da Revista Franquia & Negócios conversou com o especialista – considerado o fundador da ciência de compras – durante sua passagem pelo Brasil, em agosto, para participação no Linx Retail Forum, em São Paulo. Confira a seguir os principais trechos da entrevista e veja quais são as mudanças que devem ocorrer no mercado e como se preparar para não desperdiçar o talento nato das mulheres para as compras.

As compras deixaram de ser uma preocupação isolada do marketing e dos economistas. Diversas áreas passaram estudar o tema. Por quê?
Uma teoria importante sobre esse pensamento é que o marketing do século 20 caiu por terra e o do século 21 vigora. Atualmente muitas das tendências de marketing vêm das ruas e são cultivadas localmente, não mais para a mídia tradicional. Companhias como as de tecnologia têm notado isso e participado mais do processo.

Como o ato de comprar evoluiu com o tempo?
O jeito que comprávamos em 1999 é diferente da maneira que fazemos em 2013. E essas diferenças estão na evolução da reação do discurso. Todas as formas de comportamento do consumidor evoluíram. Nós achamos as mudanças e ajudamos.

A nova classe média brasileira tem sido um oásis, mas também um desafio para os negócios. O cenário de consumo no Brasil mudou muito. Como o comportamento do consumidor evoluiu nos últimos anos?
Primeiramente, a classe C brasileira cresceu e está globalizada como nenhuma outra no mundo. Aqui eles usam seus celulares e dispositivos de diversas formas. Sabem também o que podem negociar. Por exemplo, eu posso negociar com uma operadora de telefonia um aparelho menor, mas não posso negociar o preço da comida ou do vestuário. Já é tempo dos mentores de marketing lidar com o fato de que atualmente compartilhar a carteira é mais importante do que seu canal de competição interno.

Explique mais.
O shopping Iguatemi de Brasília foi aberto há três anos e tem 15% a 20% de lojas vagas. Isso é um desafio para os marqueteiros brasileiros: as classes A e B estão fazendo suas compras em Miami, Nova Iorque, Paris, Londres e não na Daslu, ou no Iguatemi. Essa classe de brasileiros pensa que é mais global comprar em outro lugar. Isso significa que a classe C hoje é muito mais importante do que jamais foi. Acredito que essa seja a razão de tantos outlets premium estarem indo muito bem. Eu vi um outlet no Village Mall no Rio de Janeiro essa semana e estava cheio.

Seu último livro fala que as mulheres são mais propensas ao consumo do que os homens. A entrada massiva delas no mercado de trabalho mudou esse cenário?
As mulheres estão mudando toda a cultura. Elas mudam a forma como usamos nossos telefones e o design dos aparelhos celulares. Estão conquistando mercado; em torno de 60% das graduadas nas universidades são mulheres. No Brasil, assim como em qualquer lugar, para viver na classe média precisa ter dois empregos. Atualmente, elas não são somente controladoras do orçamento, mas são influenciadas por ele. Hoje possivelmente quem diz se pode comprar o carro da família ou não é a mulher. Elas escolhem a cor, procuram resenhas na internet, máquinas de lavar e tecnologias porque os homens precisam de ajuda. Aqui ainda tenho outra teoria: o Brasil tem uma presidente mulher. E ela tem inúmeros e grandes desafios.

Então as mulheres não têm mais tempo de comprar como antigamente?
Há dez anos, as mulheres podiam ir à Daslu e passar o dia todo lá. Agora, mesmo que elas tenham condições financeiras para isso, sentem necessidade de serem produtivas. E têm um relógio correndo dentro de sua cabeça que às vezes é lento, mas na maior parte do tempo é rápido. Você entende o que eu quero dizer quando uma mulher acorda cedo, pensa em comprar até à noite e depois efetiva a compra em seus iPhones ou iPads? Elas não compram apenas quando  necessário, mas por recreação.

Como deve ser uma loja receptiva ao consumo, em que o consumidor não tenha vontade de comprar e sair correndo?
Uma das evoluções dos designers de lojas físicas é que tem sido investida muito mais atenção nos cinco sentidos: som, cheiro, toque, visão e sabor. Às vezes alguém que trabalha os sentidos dentro do espaço é muito mais criativo do que outros que gastam rios de dinheiro.

Você tem exemplos recentes?
Uma marca brasileira de lingerie tem uma assinatura em forma de aroma em todas as suas lojas. Então, uma pessoa com deficiência visual sabe onde está ao sentir o cheiro. Acho isso ótimo! A nova Daslu, em São Paulo, tem um visual muito interessante. A busca por contar histórias também torna uma loja interessante. Quase tudo que a Zara oferece, por exemplo, tem uma história. Você olha e imagina que sabe o que eles estão querendo dizer. Temos liberdade para sermos mais expressivos. Nossas escolhas são reflexos da modernidade. Eu acho que é mais interessante do que os últimos cinco anos.

Com a ascensão das redes sociais e a constante troca de informações sobre consumo, qual o papel do marketing atualmente na decisão do consumidor?
Mídias sociais são muito promíscuas e, às vezes, cruéis. Tenho mais amigos brasileiros no Facebook do que de qualquer outra nacionalidade. Em algum momento as redes sociais vão definir até que ponto vamos ver poluição de comunicação comercial. Acho que é uma das crises do marketing: como eu encontro o melhor caminho de endereçar minha comunicação mais assertiva para o consumidor, de forma mais pessoal?

Os shopping centers têm ganhado cada vez mais espaço nas cidades, principalmente no interior. Você costuma criticar esses modelos. O que deveria melhorar?
O mesmo que o Brasil deve melhorar. Trouxeram a Copa do Mundo e as Olimpíadas, mas ainda existem três desafios: garantir a segurança (sem isso o País jamais será uma potência global), eliminar a poluição (porque isso matará as pessoas) e acabar com a desigualdade social (pessoas dormem embaixo das pontes e eu não posso andar pelas ruas sem ficar com medo). Quando brasileiros vão para a minha casa, em Nova Iorque, o que mais gostam é poder andar pelas ruas, 24 horas por dia, em segurança.

Segundo seus estudos, 70% das compras são feitas por impulso. Quais são os maiores influenciadores dessa compra?
É muito relativo à idade. Compra impulsiva em uma idade mais nova é baseado naquilo que pode ser transformador. Quanto mais jovem, mais impulsivo se é nas compras para os filhos. Já os mais velhos são impulsivos para comprar, em geral, para pessoas mais próximas.

As mulheres são as especialistas em compras por natureza. Podemos dizer que os homens são os maiores responsáveis pelas compras por impulso?
Historicamente, homens e mulheres têm comportamentos diferentes para compras. Elas são graduais e os homens são caçadores. Eu tenho 61 anos e nunca chamaria meus amigos para irem comigo ao shopping, mas meu filho ou meu neto ficariam muito confortáveis com isso. Mulheres, geneticamente, são bem mais suscetíveis a shopping centers.

Como as marcas podem se beneficiar com inteligência das compras por impulso?
O papel das marcas atualmente é muito mais complexo. Não podem simplesmente colocar um logo em algo e esperar que seja universalmente reconhecido. Elas têm que prestar muito mais atenção ao acertar o alvo em todos os seus públicos.

E quanto aos e-commerces e vending machines? Há espaço para eles no futuro, sendo que, na sua avaliação, os consumidores se sentem mais à vontade com um vendedor?
Sempre procuramos alguma assistência para decisões perfeitas e isso afeta o design da loja física, mas também afeta o treinamento das pessoas que trabalham com isso. Procuramos por vending machines para produtos de conveniência, como oferecer guarda-chuvas em uma estação de Tóquio, por exemplo, ou acessórios para iPod no aeroporto de Miami. Não posso usar máquinas para vender coisas que precisem de ajuda ou que nunca tenham sido vendidas dessa forma antes.

Publicado em 17/10/2013

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